Não peça desconto na feira!

Há alguns anos, recebi uma homenagem do Conselho da Mulher Empresária, da Associação Comercial do Pará. Eu e outras quatro mulheres tivemos a honra de receber essa premiação por conta de cada uma se destacar naquele ano, em sua área de atuação.

Lembro do pequeno discurso que fiz, onde comecei com a frase: NÃO PEÇA DESCONTO NA FEIRA! E desenvolvi o motivo desse pedido: eu era criança quando acompanhava meus pais na feira, dormi várias noites numa barraca de sapatos, diariamente tive de desenvolver minhas habilidades de argumentação no atendimento aos fregueses, estudava de manhã e à tarde ia para o trabalho com meus pais, por anos a fio.

O feirante acorda cedo, muitos, às 4 da manhã estão iniciando os trabalhos, montando a banca, cuidando de uma série de problemas (proteger os produtos da chuva, substituir um transporte que falhou ou quebrou, ter dinheiro para dar troco, levar os filhos na escola, organizar os produtos de forma que possam ter menos furtos…); a vida não é fácil para quem trabalha na feira. Não quero com isso, minimizar o trabalho e esforço de outros profissionais, estou apenas relatando o que vivi, que faz parte da minha história.

Infelizmente, muita gente por trabalhar em outra profissão, se sente superior a quem trabalha na feira. E trata o feirante mal, com desdém, com desconfiança, querendo levar vantagem… e às vezes até faz questão de humilhar. Lembro de um episódio, onde eu devia ter uns 9 ou 10 anos; meu pai havia viajado, e tínhamos de ajudar nossa mãe a guardar toda a mercadoria e carregar a kombi com essa mercadoria para irmos para casa. A kombi não saiu do lugar, estava quebrada. Minha mãe desesperada, chovendo bastante, pediu para minha irmã mais velha ficar na barraca junto à mercadoria, tomando conta, e me levou consigo para o ponto de táxi. A ideia era pegar um táxi e colocar algumas caixas mais frágeis lá.

Quando o taxista nos recebeu, minha mãe explicou tudo o que precisava, ele não se contentou apenas em dizer que não nos levaria: ele abriu o carro, mostrou o quanto era bonito, limpo, e não iria jamais nos levar com uma ou duas caixas, e ainda por cima estávamos molhadas de chuva. Voltamos frustradas para a barraca, fiquei tão triste esse dia, nunca esqueci isso… bastava não nos atender, mas precisava ser cruel?

Meus pais prosperaram, mudaram para uma loja, meus irmãos estudaram, montaram seus respectivos negócios, e sempre nos ajudamos em nossas dificuldades até hoje.

Então, queridas, quando digo para não pedir desconto, na verdade me refiro a ser gentil com todos que trabalham, não importa a profissão, a escolaridade, a conta bancária. Ninguém pode ser mais importante somente por ter mais dinheiro, ou mais estudo, ou qualquer outra coisa.

Quero propor um convite a todas vocês que ainda não fazem isso: procurem olhar nos olhos de quem trabalha na feira, veja sua expressão facial, suas mãos, escute ativamente sua fala… interaja verdadeiramente com essa pessoa.

Por ter sido criada nesse local, eu não peço desconto, faço exatamente o contrário: dou gorjeta. Porque me lembro também, até hoje, das poucas que recebi de pessoas tão carinhosas e o quanto me fizeram felizes. Não apenas pelo valor, mas por eu sentir que nesse momento, elas me olharam de verdade.

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